23 março 2008

Justificável

Basta ser justificável para que a chuva não atrapalhe o compromisso, para que a preguiça não seja desculpa e o cansaço não limite o desejo.

Ter conhecimento do próprio limite é saber aguentar um, dois, três socos bem dados enquanto o esforço valer a dor.

Quando ele passa da validade, o valor se perde. Afinal, com esforço em vão não se brinca e não se ganha.

Perde-se a si mesmo quando a vontade morre.

O desgaste entra pela porta da frente, acomoda-se no sofá da sala, põe os pés sobre a mesa. É quando o brilho se esvai, o caminho passa a ser longo demais, a fruta apodrece, o sabor some, o colorido vira preto, branco e cinza.
O ar falta.
Uma hora, o ar sempre falta.

A partir daí, o grande ponto da questão é se você vai ou não encontrar outra maneira de respirar.

Para isso, basta ser justificável.

05 março 2008

Marionete

O tempo não para e todo relógio continua.

Relógios foram feitos para entregar o relatório, assar o bolo, terminar o expediente e colocar a criança para dormir. Monitoram cada ação, amontoam afazeres, sincronizam nossas necessidades com uma mania robótica.

Em suma, nos fazem marionetes.

Meu relógio de pulso é ligeiramente oval, analógico, desprovido de fábrica do ponteiro de segundos - mero detalhe.

Quebrado, estático, morto - é a impressão que tenho quando insisto em encará-lo.

Por um segundo, tenho a sensação de congelar o tempo, mas as pernas impacientes continuam batendo os pés no chão e vozes ainda saem de bocas falantes.

O tempo não para e meu relógio trapaceia minha mente.

No fim das contas, é essa trapaça que nos deixa com a sensação de não ter tempo para nada.

01 março 2008

Essencial

Essencial, a saudade.

É como se diferencia o que vale a pena do que não faz diferença.
É quando a gente sente o perfume, ouve a música, vê o lugar e faz ressurgir da alma a pessoa, o fato, a infância.

É sentir que, apesar do tempo, ainda há festa aí dentro.

Saudade é a festa ausente.
Ausência só é falta enquanto permanecemos na memória de outras pessoas.

Você não existe se as pessoas não se lembrarem do que você fez, do que você disse ou de como você as fez sentir.

Presença só preenche o vazio se você marcou de alguma forma.

Se não, sua presença é qualquer presença.

E sua ausência é tão ausente que ninguém nem sente.

Linkwithin

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...